A Louca da Casa
Carmo Miranda Machado
Nasce o Sol no Alentejo, reza a letra do nosso cante…
Desde que me lembro de ser gente, recordo sempre com prazer redobrado o sol abrasador no Alentejo profundo. Não guardo memória dos dias de chuva ou de frio. A estes, arrumei-os na gaveta do que não quero recordar. Relembro, isso, sim, os dias quentes e lentos em que, descalça, aguardava pelo final da tarde, preguiçando, aqui e ali, a uma sombra.
O Sol, em qualquer religião, sempre foi considerado o deus mais importante. Mitra para os persas, para os hindus era Brahma, Adonai para os fenícios, Helios e depois Apolo para os gregos, para os astecas Quetzalcoalt. Na maçonaria usa-se a forma Sol-om-on – a expressão da luz. Este, seja qual for a religião que o proclame, será sempre o objeto do meu culto. Com efeito, a minha oração foi e será sempre ao Deus Sol.
A estrela central do sistema solar, astronomicamente falando, é também o centro da minha vida. A luz solar não é só a principal de energia do planeta Terra. Ela é também a minha principal fonte energética, sem a qual me sinto esmorecer e me torno cinzenta a aborrecida. Sem sol, fico estranha e sem qualquer luz. Só o Sol me revitaliza e renova. Só o Sol, de preferência forte, é a grande força espiritual da minha vida. A verdade – para minha satisfação – é que estes próximos dias prometem-nos calor a sério, com temperaturas elevadas.
Gostaria assim de recordar nesta crónica solarenga e cheia de conteúdo – como já pode compreender – a forma como nós, os do Sul, descrevemos o tempo. E se nos dias fresquinhos (20 graus centígrados) e de tempo escapatório, para nós aí a rondar entre os 20 e os 30 graus, nos sentimos bem na nossa pele, quando ele – o calor – dá em apertar, chegamos facilmente a temperaturas que ultrapassam os 40 graus, por nós carinhosamente designadas por calor dum cabresto ou mesmo calor dum cabrão. E o mesmo se passa quando os termómetros teimam em descer… Ora, estando já o verão à espreita, nada melhor do que sonhar com os dias em que, a sul, poderei espreguiçar-me, sem pressa para chegar a nenhum lugar.
Pela parte que me toca, o Alentejo para mim só o é com sol abrasador. Gosto dos dias de Julho, quando o sol não nos dá tréguas, queimando as pedras da calçada que percorro descalça, à noite. Gosto de sentir na pela nua o peso do Sol, derrubando-me. E gosto, sobretudo, quando ele começa a esconder-se atrás da planície, grande e redondo, devagar como nos convém.
O Alentejo, ao entardecer do Outono, provoca-me um aperto no coração em forma de susto. E o Inverno profundo, quando a chuva começa a cair forte sobre a planície, provoca-me uma grande e inevitável melancolia. Sem sol, o meu Alentejo morre-me. E mata-me. Quem já viveu os invernos do Alentejo profundo, conhece o vazio que a noite traz quando o silêncio invade as aldeias, as ruas, as casas e se instala dentro de nós.
Sou, sempre fui, mais feliz ao Sol.