Marias
Leopoldina Pina de Almeida
O título deste EntreMarias foi roubado de um excelente documentário realizado em 2017 pela minha querida amiga Helena Inverno e pela Verónica Castro (também amiga, mas com quem não privo tanto) sobre o Cancro da Mama no Baixo Alentejo.
Cancro da Mama. A primeira palavra assusta. A junção das duas torna o efeito assombroso. Para quem teme. Para quem tem. Principalmente no início do processo. Num diagnóstico que normalmente começa pela frase “As noticias que tenho para si não são as melhores…” e que prossegue internamente com um turbilhão de perguntas. Porquê a mim? Porquê agora? Porquê aqui? E depois, o resto. O contar @s outr@s. O que se diz e o que fica por dizer. O peso das palavras e dos olhares. O medo. O esconder o medo. Para não contagiar com ele aquel@s de que gostamos. Para que ele não aumente nessas transmissões. Os tratamentos. E depois, coisas completamente diferentes. Os encontros inesperados. Os novos sentimentos que surgem. Talvez bonitos. Talvez desesperados. Talvez inspiradores. De quem menos se espera. De quem se acabou de conhecer. De parte de nós que ainda não conhecíamos. E a espera. E o medo. E a cirurgia. E a dor. E a alegria. E a esperança. E talvez mais tratamentos. E a solidão. E a gratidão. E o medo. E a fragilidade. E a força. E a reação d@s outr@s. D@s mais afastad@s e d@s mais íntim@s. E afinal o que é a Intimidade? E o Corpo? E o Amor? E o Sexo? E Nós? E quem sou Eu agora?
Tod@s somos diferentes. As nossas redes de apoio também não são as mesmas. Transformam-nos e transformam-se com novas realidades. E aquilo a que vulgarmente chamamos cancro, também não é a mesma coisa. Eu ainda sou do tempo em que esta palavra era omitida. Substituída pela expressão doença prolongada. Como se o medo aumentasse ao ser verbalizado. Como se de uma doença verbalmente contagiosa se tratasse.
Este mês de setembro vamos falar. Sem medos ou com eles. Falar sobre o Cancro da Mama. Sabemos que este não é o Mês do Cancro da Mamã. Não nos quisemos adiantar. Apenas nos vimos rodeadas de Mulheres cuja vida começou a ser modelada por esta realidade. Amigas que viram as suas rotinas alteradas por esta presença constante. Com diferentes graus de acolhimento ou rejeição, mas que em todas implicou transformações significativas. Desde o próprio aspeto físico, até às questões relacionais, familiares, profissionais e de identidade pessoal. É com elas que vamos falar. Falar sobre o Cancro da Mama. E principalmente escutar. Escutá-las e escutar o que ressoa dentro de nós através das palavras, dos olhares e dos silêncios. Porque se há desafio que estes cancros da vida nos convidam a fazer, é o de parar. Deixar de ser autómat@s telecomandad@s e perceber o que é realmente importante para cada um/uma de nós. Ou também há meses, dias ou horas preestabelecidos para estas coisas?