Há mulheres que, não sendo exatamente feministas ou ativistas de um qualquer movimento que promova e defenda os direitos das mulheres, gostariam que a sociedade se aproximasse cada vez mais do que se convenciona ser a igualdade de oportunidades, equidade de género, e outras denominações similares que no fundo significam criar as condições efetivas para que as mulheres não sejam inferiorizadas, desvalorizadas e discriminadas nas esferas privada ou doméstica, familiar, profissional, social. E depois há, claro, as mulheres militantes que abraçam a causa da luta das mulheres pela sua visibilidade cívica e política, afirmação artística, presença em lugares de decisão e chefia, etc. Acho muito bem, é uma luta antiga, é uma luta que prosseguirá.
Ora, eu, que não uso emblemas de axilas farfalhudas, nem pertenço a clubes nem a seitas, não deixo de observar, de entre aquelas que referi atrás, comportamentos que não me parecem coerentes, senão mesmo contraditórios, com o que defendem, de forma mais ou menos empenhada e organizada. São coisas sem importância, dirão elas. Ou são coisas em que nem sequer reparam, dirão também. Serão pormenores, mas que simbolizam algo que, do meu ponto de vista, dá continuidade à menorização das mulheres. E a que me refiro? Refiro-me ao cavalheirismo e aos seus rituais. Mulheres que gostam que lhe deem passagem à entrada de uma reunião ou na fila da caixa do supermercado com a garbosa expressão “primeiro as senhoras”. Mulheres que apreciam que o homem se antecipe no almoço de família e puxe a cadeira para elas se sentarem. Mulheres que ficam agradadas quando o homem sai do carro e vai em passo alfa dar a volta ao veículo para lhes abrir a porta. Mulheres que não protestam quando o macho depois do jantar no restaurante estica o seu braço de provedor ancestral de comida e afirma “pago eu, era o que faltava!”. Mulheres que aceitam este sexismo disfarçado que as menoriza e desqualifica, ou a posiciona como incapazes, frágeis, vulneráveis, desprotegidas.
Eu não quero ser “a primeira” pelos piores motivos, por condescendência ou amabilidade culturalmente definida. Do mesmo modo que não quero ser “a última” só porque sou mulher, e isso representar uma desvantagem inultrapassável pelo mérito ou pela competência. Sou pessoa cidadã, a minha dignidade não tem sexo nem género. E o lugar a que chegue, nas classificações da vida e da sociedade, seja o primeiro ou o último ou outro qualquer, que seja apenas e só porque merecido e justo, sem que a marca de género me prejudique ou beneficie.