Maria Campaniça
Celina Nobre
Este não é um artigo científico. É de opinião. E circunscreve-se ao nosso país. Acrescente-se que também não é propósito do mesmo dissecar as tramoias, do entra e sai do actual governo, quase mais rapidamente do que se sai dum qualquer supermercado. Não será, seguramente, portanto, um texto para falar do PS, do PSD, do PCP, do CDS, do Livre, do IL ou do Chega, em particular, ou até mesmo da intervenção dos diferentes Presidentes da República, desde que, no pós-25 de Abril, se encetou em Portugal a implantação do regime democrático. Para isso, temos a comunicação social que vai fazendo o seu papel, muitas vezes sem grande atenção aos princípios do respectivo Código Deontológico e os cidadãos que supostamente vão fazendo as suas leituras dos ditos casinhos, ou casos, de acordo com a importância relativa atribuída a cada um deles. E temos a academia.
Há, porém, uma verdade que me parece inquestionável que é a de que os partidos políticos se constituem como pilares da democracia, onde assenta a possibilidade de escolha dos cidadãos, em particular numa democracia representativa como a que temos constitucionalmente definida. Sendo que há um princípio, que mantém alguma vitalidade nos sistemas democráticos, é, pois, o da confiança. Ora, é exactamente esse princípio que, ao longo dos quase 50 anos de democracia, em vez de se consolidar e de se fortalecer, em Portugal, tem definhado a olhos vistos. E os partidos políticos não estão isentos da sua quota parte de responsabilidade, na quebra desse laço, tão vital à regeneração do modelo democrático. Desse facto tem resultado um claro afastamento dos cidadãos eleitores da vida política, constituindo de tal evidência os números, absolutamente assustadores da abstenção. Algo não corre bem quando o elementar exercício de ler os programas eleitorais e de se dirigir a uma mesa de voto para fazer uma cruz e dobrar a sua escolha, colocando-a numa urna selada, para que no final do dia se chegue ao programa vencedor, seja menosprezado. Como se já nada houvesse para decidir e como tal as escolhas, dos que ainda adoptam esta prática, fossem todas igualmente ruins e por isso já não merecedoras de qualquer manifestação de vontade.
– Tantos antepassados nossos entregaram a vida à luta pela democracia, pelo direito ao voto. Sim. Também ao das mulheres.
E a memória dos que a deveriam preservar parece tão curta que confundem governar um país, com o governo de um partido. Enquanto prevalecer esta visão, ou, no caso concreto, a falta dela, não haverá Comissão de Avaliação de escolhidos para as diferentes pastas governamentais que salve a honra deste convento. Até, porque, em face das circunstâncias, já ninguém sabe o que lé vai dentro e a lisura de carácter, a idoneidade, a percepção da supremacia do bem-comum face ao individual, entre outros atributos, necessários ao exercício de cargos públicos, nunca os vi plasmados em CV’s.
Trata-se, pois duma questão política. É essa a dimensão em que teria que ser tratada. E corajosamente pelos principais intervenientes, em particular pelos diferentes órgãos de soberania. Enquanto todos decidirem encerrar os casinhos ou os casos do dia com:
– Esse caso está encerrado. Não há mais nada a dizer sobre ele.
Ou ainda:
– Não contem comigo para dissolver a Assembleia da República, porque o país precisa de estabilidade.
Está tudo dito. E feito.
Um dia quando acordarem, pode ser já tarde. Podem ter uma mordaça na boca. E os partidos políticos, alguns terão uma ainda maior. Mas todos perderam a oportunidade de se pensarem para dentro. Com humildade. Assumindo os casinhos e os casos, inventariando soluções, sustentáveis, partilhadas e responsáveis para não tornar a nossa República, na República das bananas. É que neste tipo de repúblicas vale tudo, mas o povo não aguenta.
Eu, à precaução, até a dormir, vou começar a ficar atenta. Mais atenta.
Mordaça por mordaça prefiro que me a ponham acordada!