Idos de julho
Sónia Calvário
Ao longo da minha vida social e profissional, sempre lidei com muita gente, de várias faixas etárias, de níveis académicos e de contextos económico e sociais distintos, tendo amigos ou nutrindo respeito por pessoas com ideologias políticas diferentes, quase antagónicas, das minhas. Depois de uma longa fase de “tolerância”, e não sei se por causa da idade, entrei numa etapa de completa falta de paciência para certas coisas… e o que me faz escrever estas linhas de balanço do mês de julho, que na verdade é mais um desabafo, é uma delas: o preconceito.
Se, em tempos, conseguia ter, ainda, empatia para tentar compreender as razões que levavam pessoas, que considerava, a justificar o que, para mim era desprovido de sentido, agora já não consigo.
Cresce o ódio, a falta de vergonha e até “o orgulho” em expressar publicamente sentimentos e posições desumanas. Defende-se, com “argumentos” típicos da Idade Média, o indefensável.
Não aceito o preconceito. E se for em função do género, da orientação sexual, da origem étnica, social ou económica já não o tolero.
Não tenho dúvida que existe racismo. Não tenho dúvida que existe xenofobia. E não tenho dúvida que existe preconceito, relativamente ao que é diferente, ao que não corresponde àquilo que se convencionou de “normalidade”.
No séc. XXI, em Portugal, país que tem nacionais ou descendentes, pelas razões que todos conhecemos, espalhados pelo mundo, que tem “a mais esclarecida população de sempre” (como tantas vezes se apregoa), fazer-se, e disseminar-se, a apologia do discurso fácil, popularucho, aproveitando o medo e a insegurança das pessoas, é intolerável. E é triste constatar que existem muitos, alguns que jamais imaginaríamos, que se deixam minar por esta malta, sem princípios, “antissistema”, mas que bem se tem aproveitado (ou querido aproveitar) dele, e que, sem qualquer vergonha, ostenta simbologia proibida pela Constituição Portuguesa, faz apelo e estimula o ódio.
Já não tenho paciência. Acabou-se-me a tolerância!
Sugestão de leitura: “Racismo à Portuguesa” (crónicas Jornal Público, agosto e setembro de 2017)
Uma opinião sobre “Acabou-se-me a paciência”